Tormenta: Império de Jade


Olá pessoas!
Quem acompanha o meu blog há muito tempo sabe do meu gosto para animes, mangás e, mais recentemente, light novels. Tudo começou com Cavaleiros do Zodíaco, mas logo escalou para drogas mais pes... digo, obras mais diversas, ao ponto de eu ter narrado e jogado muitos RPG baseados em animes (minhas adaptações de Naruto para 3D&T Alpha e Savage Worlds que o digam). Desta forma, quando soube da existência do Império de Jade, o “cenário oriental” ambientado no selo nacional Tormenta, eu tinha que conferir! E é sobre este jogo que dividiu meu coração que falarei hoje.

Apresentação
Antes de começarmos esta resenha, quero deixar uma coisa clara: eu pouco conheço sobre Tormenta. Nunca li qualquer livro de RPG de Tormenta, nem mesmo após o seu relançamento pela Editora Jambô, seja em sua versão atual (chamada de TRPG) ou mais recentemente para 3D&T Alpha. Para não dizer que sou completamente ignorante quanto ao mundo de Arton, eu já joguei algumas aventuras nele usando regras de outros sistemas e li o quadrinho Holy Avenger, o primeiro volume da famigerada trilogia escrita por Leonel Caldela e alguns capítulos do quadrinho Leed, mas é só. Assim, mesmo que eu já tenha tido contato com o cenário, não esperem que eu o domine. De fato, meu limitado conhecimento sobre ele é fortuito, permitindo-me analisar o livro do Império de Jade como um jogo totalmente isolado. Dito isto, vamos em frente.

Escrito por Marcelo Cassaro, Álvaro Freitas e Guilherme Dei Svaldi, Império de Jade é um RPG ambientado na ilha de Tamu-ra, a nação “oriental” do mundo de Arton que, no passado, havia sido destruída por uma Tormenta, mas que agora está livre da tempestade rubra e vive um período de renascimento. Entretanto, seu livro vai além de um simples suplemento ambientado num canto isolado do cenário: ele é um material completo, tendo todas as regras necessárias para se jogar, trazendo raças, classes e até regras novas para o sistema. Entretanto, devido as mudanças que apresenta, o livro sugere que a construção das personagens do Império de Jade não seja misturada com a do Tormenta RPG, por mais que seja possível usar as personagens de um jogo no outro.

O livro em si possui cerca de 340 páginas, sendo todo colorido e com ótimas ilustrações, entre muitas inéditas e algumas recicladas (posso não conhecer Tormenta, mas tem muita imagem ali que já vi em alguns livros de 3D&T ao longo dos anos). Ele está dividido numa introdução e nove capítulos, compreendendo tudo que os autores entendem que é necessário para se jogar em Tamu-ra, e sem depender do Tormenta RPG. Seu texto é bem escrito e de leitura fluida, o que é muito bem-vindo. Já o seu PDF está bacana, com marcações e hiperlinks que ajudam na busca por informações. Contudo, é na sua versão física em que o livro brilha (literalmente, dependendo da luz). Com um acabamento impecável e cores vibrantes, o livro é apenas maravilhoso. Seu preço é um pouco salgado, mas está dentro do custo de mercado para a qualidade do material.


Cenário e Personagens
A Introdução do livro abre com um pequeno conto e contextualiza o que é Tamu-ra e o evento que a destruiu. Em seguida, ela apresenta com mais detalhes o cenário, mostrando a sua linha temporal, suas cidades, pontos notáveis, seus povos e suas maiores ameaça. O capítulo continua apresentando o básico de todo livro RPG, explicando o que é o jogo e como ele deve ser jogado. Creio que uma das partes mais importantes do livro são as “Dez Coisas a Saber” (e algo para o qual tiro o chapéu do meu amigo Leishmaniose, já que eu não tenho um), que lista algumas das informações mais importantes que os jogadores devem saber para se jogar um RPG ambientado numa nação oriental e as diferenças entre um jogo em Tamu-ra e um na Arton clássica.

Seguindo a leitura, o primeiro capítulo aborda a construção das personagens. Como em todo sistema d20, o capítulo lista as habilidades, as raças, as classes e as demais características da personagem. Existem oito raças em Império de Jade, sendo elas: humanos (o de sempre), hanyô (também conhecidos como meio-youkais, uma mistura de humano com ser místico oriental), henge (animais inteligentes capazes de assumir uma forma humanoide híbrida), kaijin (seres que sofreram terríveis mutações por influência da Tormenta), mashin (construtos com livre-arbítrio criados através de uma tecnologia há muito perdida, sendo vastamente respeitados pelos tamurianos), nezumi (raça “selvagem” de ratos antropomórficos conhecida por sua personalidade rude e hostil), ryuujin (crianças que foram tocadas pelo poder do deus dragão Lin-Wu e “ascenderam” como seus filhos), e vanara (raça de macacos antropomórficos conhecida por sua imensa inteligência e sabedoria). Já as classes são divididas em: bushi (lutador resistente), kensei (guerreiro especialista numa arma), monge (artista marcial), ninja (assassino e espião furtivo), onimusha (caçador de monstros com poderes monstruosos), samurai (guerreiro honrado), shinkan (mestre em magia espiritual), shugenja (usuário da magia divina), wu-jen (conjurador caótico), e yakusa (fora da lei cheio dos contatos). Pessoalmente gostei muito das raças e das classes do jogo, que trazem, além das suas regras específicas, muita informação sobre a história e cultura do cenário em si.

Outra característica bastante abordada neste capitulo é a honra. Em Império de Jade, a honra não é apenas um princípio a ser seguido por aqueles de coração nobre, mas literalmente uma habilidade com valor e influência direta nas regras. Entretanto, por mais interessante e importante que a honra seja no jogo, eu não curti tanto assim a forma como ela é abordada. Para se ter uma ideia, ela é explicada ao longo de quase dez páginas, possuindo uma lista enorme de formas de perdê-la (chamada de violações) e outra para recuperá-la, fora as formas como ela influência as habilidades de classes, talentos e outras características das personagens. São tantos detalhes que desestimula usar em jogo, o que praticamente inutiliza as classes samurai e shugenja. No fim, eu vejo como uma boa ideia, mas que foi trabalhada em exagero sem necessidade (aqui cabe aquela expressão de que “menos é mais”).

O segundo capítulo lista as perícias e os talentos que as personagens podem ter. Não há muito o que se comentar sobre este capítulo. Como não conhecia o Tormenta RPG, posso dizer que gostei bastante da lista simplificada de Perícias e do uso da regra de treinamento, mas fiquei desesperado só de ver a gigantesca lista de Talentos. Os Talentos são basicamente os mesmos do D&D 3ª edição, mas com pequenos ajustes e MUITAS adições (considerando apenas os livros básicos). Pessoalmente tenho pavor a enormes listas de talentos que só estimulam o jogador a combar, tendo sido algo que me afastou de todo e qualquer RPG baseado na 3ª edição, mas posso dizer que já esperava por algo assim no Império de Jade.


Mecânicas
O terceiro capítulo fala dos equipamentos. Trata-se de um capítulo bem objetivo, listando armas, armaduras, escudos, serviços, veículos, montarias, acessórios e o que mais pode ser comprado pelas personagens, com exceção de itens mágicos. Ponto positivo para as ilustrações das armas e armaduras, contextualizando-as à proposta oriental do cenário.

O quarto capítulo apresenta as magias. Diferentemente do padrão adotado pela 3ª e 5ª edição, as magias em Império de Jade usam pontos de magia para serem conjuradas. Aqui elas são chamadas de jutsus (Naruto?), sendo separadas por seis Chacras ao invés de Escolas (um para cada Habilidade), e cinco graus de poder (similar aos ranques dos jutsus de Naruto). Já suas demais regras, como alcance, duração, efeito e testes de resistência, seguem o padrão do D&D 3ª edição. Eu gostei muito da forma como as magias são abordadas no Império de Jade, mas fiquei triste por elas serem basicamente as mesmas do D&D tradicional com uma “nova roupagem”. Ao menos existem algumas magias novas e outras que unem os efeitos de duas ou mais magias num único jutsu, tornando-as mais interessantes. E, ao final do capítulo, somos agraciados com mais uma lista enorme para os jogadores escolherem.

O quinto capítulo aborda as regras gerais do jogo, explicando como os testes devem ser feitos, suas dificuldades, oposições e outros detalhes. Aqui também são apresentadas as regras para os combates, seguindo bem o modelo do D&D 3ª edição (ação padrão, ação de movimento, ação completa, ação livre e reação), e sobre dano e ferimentos. Por fim, o capítulo traz regras simples para quebrar objetos e combate montado.


Narrador
O sexto capítulo explica de forma sucinta como mestrar o jogo. E quando falo “sucinto”, quero dizer resumido mesmo. O capítulo é minúsculo! Pessoalmente acho este um dos capítulos mais importantes nos RPG atuais, pois é nele que se deve ensinar ao narrador como criar e conduzir uma sessão de jogo, mas o Império de Jade se limita apenas a explicar o básico sobre o assunto. De fato, o capítulo apresenta todas as ferramentas essenciais para que um narrador veterano possa conduzir uma aventura no estilo do D&D 3ª edição, e é só isso. Faltam exemplos para auxiliar os novatos (algo que falta no livro todo, por sinal).

O sétimo capítulo traz um pequeno bestiário. Mais uma vez, atenção a palavra “pequeno”, pois apenas 40 monstros são apresentados aqui. Quando resenhei o Pugmire, comentei que seu bestiário tinha poucos monstros (coincidentemente o mesmo número do Império de Jade), mas ao menos possui regras para que o narrador crie os seus próprios. Contudo, em Império de Jade isso não é possível, pois ele não explica como criar os monstros (adversários comuns podem ser criados como personagens, mas só de imaginar a trabalheira já dá desgosto). Por se tratar de um sistema que ainda premia as personagens com pontos de experiência ao se matar inimigos, o fato de haver pouca variedade deles é um ponto negativo. Evidentemente que é possível usar criaturas lançadas em outros materiais de Tormenta RPG em suas aventuras, mas como um produto isolado, o Império deixa bastante a desejar neste aspecto.

O oitavo capítulo trata das recompensas que podem ser obtidas pelas personagens ao longo das aventuras. Pessoalmente é o pior capítulo do livro, mostrando apenas listas e mais listas de tesouros, itens mágicos e o que mais for possível imaginar. Nem vou me dar ao trabalho de dizer porque ele é tão ruim, mas caso gostem de caçar tesouros quando estão jogando RPG, este capítulo foi feito para vocês. Para não dizer que ele é completamente ruim, suas últimas páginas apresentam regras interessantes para reputação, honrarias e aliados.

Por fim, o nono capítulo explica em detalhes a nova capital de Tamu-ra, Shinkyo, apresentando seus pontos notáveis, organizações e personalidades. É um capítulo que complementa e aprofunda as informações do cenário, criando um ponto de partida que os narradores podem usar para criar suas aventuras. É uma pena que o livro não traga nenhuma aventura pronta, o que caberia bem neste capítulo de encerramento.


Fechamento
Ler o Império de Jade foi complicado para mim. Durante os primeiros capítulos eu estava maravilhado com o cenário e suas possibilidades, principalmente pelo seu espírito de fantasia oriental muito bem-vindo e que adoro. As raças e até mesmo as classes possuem uma forte ligação com o cenário, unindo perfeitamente as mecânicas e a história. Entretanto, nem tudo são flores. Ao ler capítulos como os dos equipamentos, talentos e jutsus, tive a sensação que estava basicamente lendo listas e mais listas de coisas que as personagens podem adquirir. E no caso dos narradores a coisa é ainda pior, pois a maior parte das listas não possuem informações claras sobra a forma como podem e devem ser utilizadas, o que seria facilmente contornável com exemplos. E nem vou entrar em detalhes sobre as regras que, mesmo levemente simplificadas, ainda usam a base do que, para mim, é a pior edição de D&D (e gosto não se discute, não é mesmo?).

Sem dúvida Império de Jade é um livro lindo e um trabalho que vale a pena ser lido. Contudo, pessoalmente não me sinto nem um pouco a vontade de jogá-lo usando suas regras (já tive traumas o suficiente com D&D 3ª edição). A impressão que fica é de um cenário ótimo e atual, mas um jogo preso ao passado com suas regras antiquadas e que não seguem as tendências dos RPG mais recentes (o que é uma pena). Mas se vocês gostam e não têm problemas com estas mecânicas, nem é preciso pensar duas vezes antes de adquiri-lo.

Até and Bye...
Postado originalmente no Mundos Colidem.

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